Comunicação

Acordos de Pesca na Amazônia: Uma Semana de Transformação e Integração entre Pescadores e Territórios

Encontro promove discussões para a promoção da Conservação e Justiça Social na Amazônia

Por Eduardo Matheus Von Muhlen

Entre os dias 25 e 29 de novembro de 2024, o Instituto Juruá, com apoio de parceiros, como CI Brasil, ASL, FGV, WCS e SEMA-AM, promoveu dois eventos integrados que marcaram um passo importante para a gestão sustentável dos recursos naturais e a justiça social na Amazônia. A “Oficina Comunitária para Elaboração do Protocolo de Monitoramento dos Acordos de Pesca do Estado do Amazonas” e o “I Curso de Acordos de Pesca: Estratégia para Conservação, Sustentabilidade e Justiça Social” reuniram mais de 50 participantes, incluindo líderes comunitários, pesquisadores, gestores públicos e representantes internacionais.

Este encontro representa uma grande oportunidade de compartilhar experiências, discutir desafios e construir soluções coletivas para problemas complexos que afetam a pesca na Amazônia. O destaque foi dado à força das comunidades locais como protagonistas na criação e implementação dos acordos de pesca – uma ferramenta estratégica para a gestão da pesca em diferentes territórios, que conecta conservação ambiental, geração de renda e equidade social.

Pescadores(as), manejadores(as) de pirarucu e colaboradores(as) do curso e da oficina reunidos para a foto oficial.
Acervo Instituto Juruá.

Acordos de Pesca: Conservação e Melhoria da Qualidade de Vida das Populações Amazônidas

A relevância dos acordos de pesca vai muito além da conservação dos recursos naturais. Esses instrumentos têm sido fundamentais para resolver conflitos territoriais, proteger estoques pesqueiros e garantir os direitos das populações tradicionais sobre seus territórios. “Ninguém protegerá melhor a Amazônia do que quem vive nela. Os acordos de pesca devolvem o poder às comunidades e mostram como a conservação pode ser um modo de vida.” Destacou João Campos e Silva (JB), Coordenador Geral e Presidente do Instituto Juruá.

Um exemplo emblemático foi o caso do Médio Juruá, onde o manejo comunitário do pirarucu aumentou os estoques da espécie em mais de 600% nos últimos 15 anos. Hoje, o acordo de pesca existente na região – popularmente conhecida como baixo Carauari ou baixo médio Juruá – não apenas gera renda significativa, mas também fortalece a autonomia das comunidades. Silas, manejador desta área, liderança local e Especialista em Manejo Comunitário do Instituto Juruá, contou emocionado: “Antes, não tínhamos recursos e estávamos perdendo nossos peixes. Agora, podemos proteger nossos lagos, alimentar nossas famílias e gerar renda com dignidade.”

Silas, pescadores e manejadores de pirarucu do Acordo de Pesca do Baixo Carauari. 
Acervo Instituto Juruá.

Além disso, os acordos têm impulsionado a equidade de gênero e o protagonismo das mulheres na gestão comunitária. Paula Etiane, técnica em pesca e palestrante no curso, afirmou: “A participação feminina traz solidariedade e cooperação. Estamos mudando o papel das mulheres nos acordos, de invisíveis para protagonistas.”

Protocolo de Monitoramento: Prospectando o  futuro com base em dados e saberes locais

A oficina comunitária teve como objetivo principal construir um protocolo participativo para monitorar os 48 acordos de pesca regulamentados no estado do Amazonas. Combinando saberes tradicionais e ciência, o protocolo buscará avaliar a eficácia dos acordos com base em parâmetros ecológicos, sociais e institucionais. O trabalho foi marcado por debates enriquecedores e a troca de experiências entre representantes de diferentes regiões.

Sannie Brum, especialista em Pesca Amazônica da Wildlife Conservation Society, lembrou: “Monitorar não é apenas medir; é proteger. É saber o que está funcionando e onde precisamos melhorar. Mais do que isso, é empoderar as comunidades para que se tornem guardiãs de seus territórios.”

Entre as contribuições práticas apresentadas, destacou-se a proposta de integrar tecnologia e conhecimento local, como o uso de aplicativos de ciência cidadã que permitem registrar dados de pesca e invasões de território em tempo real.

Troca de Experiências: União entre territórios e pescadores amazônicos

O evento foi também uma oportunidade para fortalecer alianças internacionais e promover uma reflexão sobre ordenamento pesqueiro em uma escala mais ampla e integrada. Representantes do Proyecto VASI e da Dirección Regional de la Producción de Loreto, do Peru, compartilharam desafios semelhantes aos enfrentados no Brasil, como a dificuldade de implementar políticas públicas que contemplem as comunidades locais. Javier Chavez, pesquisador da Universidade de Iquitos e membro do Proyecto VASI, ressaltou a importância do diálogo: “As histórias brasileiras nos inspiram. Vemos que é possível combinar manejo sustentável com justiça social, mesmo enfrentando tantos desafios.”

Casos recentes, como o das comunidades de Itamarati, mostraram como a troca de conhecimentos pode transformar realidades. Apesar das resistências iniciais, a implementação de um acordo de pesca trouxe novas perspectivas para a região. Leonardo, líder comunitário da região, relatou: “Achávamos que o manejo era só para fechar lagos. Hoje, vemos que é uma forma de garantir nosso sustento e proteger nosso futuro.”

Participação especial de Javier Chavez, pesquisador peruano da Universidade de Iquitos e membro do Proyecto VASI.
Acervo Instituto Juruá.

Educação e Fortalecimento Comunitário

O I Curso de Acordos de Pesca foi desenhado para ampliar o entendimento sobre os múltiplos benefícios desses instrumentos. Armênio, líder indígena e palestrante, enfatizou: “Os acordos são mais que um conjunto de regras. Eles são ferramentas de fortalecimento social que dão às comunidades voz nas decisões sobre seus recursos.”

Dinâmicas práticas durante o curso permitiram que os participantes discutissem temas, como zoneamento, gestão coletiva e soluções para conflitos. Histórias de sucesso, como o acordo do Baixo Carauari, foram destaque. Silas compartilhou: “Com nosso acordo, 73 toneladas de pirarucu foram manejadas em 2024, gerando renda para dezenas de famílias e fortalecendo nossa governança local.”

Resultados e Legado

Os dois eventos encerraram com a elaboração de um conjunto de recomendações e compromissos, que serão encaminhados ao governo do estado e organizações parceiras. Além do protocolo de monitoramento, os participantes destacaram a necessidade de investir em educação, fortalecimento de lideranças comunitárias e inclusão de jovens no manejo sustentável.

Como destacou JB no encerramento: “Os acordos de pesca nos ensinam algo poderoso: quando trabalhamos juntos, respeitando nossos saberes e territórios, somos capazes de criar um futuro melhor para todos.”

João Vitor Campos e Silva (JB) com a palavra. 
Acervo Instituto Juruá.

O Instituto Juruá reafirma seu compromisso com a conservação da Amazônia e a valorização das comunidades que nela vivem. Essa semana foi apenas o começo de novas ações e parcerias voltadas para a implementação e o fortalecimento dos acordos de pesca na Amazônia, visando promover maior justiça social e proteção à biodiversidade em territórios diversos.

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