COMUNICAÇÃO

Conflitos entre pescadores e a megafauna aquática da Amazônia

Apesar dos conflitos que atrapalham a pesca, pescadores afirmam que podem conviver com espécies da megafauna, mesmo que suas populações aumentem no futuro.

Por Patrick Cook e Clara Machado

A enorme biodiversidade amazônica proporciona fartura de alimento aos seus moradores, sobretudo de peixes, que são a principal fonte de proteína da maioria dos povos da região. Porém, essa mesma biodiversidade incrível também oferece ameaças, quando pescadores lidam diariamente com animais grandes como o jacaré ou animais que espantam peixes e destroem as redes de pesca, como o boto. A conservação da vida selvagem de água doce e o manejo de conflitos entre o ser humano e a vida selvagem são um grande desafio para a conservação global. 

Os conflitos entre as pessoas e esses animais aquáticos podem ocorrer através de ataques, espécies que se alimentam de peixes presos nas redes de pesca, danos aos equipamentos de pesca e enredamento dos animais. Para entender melhor como os pescadores lidam com esses conflitos e como eles podem afetar a conservação dessas espécies, Patrick Cook liderou um estudo com a participação de pesquisadores do Instituto Juruá que documenta os conflitos entre pescadores e quatro espécies da megafauna aquática amazônica: o jacaré (Melanosuchus niger), a ariranha (Pteronura brasiliensis), o boto (Inia geoffrensis) e o tucuxi (Sotalia fluviatilis).

Acima: jacaré (Melanosuchus niger) e ariranha (Pteronura brasiliensis) (Foto: Frank Hajek)
Abaixo: boto (Inia geoffrensis) e tucuxi (Sotalia fluviatilis) (Foto: Sannie Brum)

No trabalho “Human-wildlife conflicts with crocodilians, cetaceans and otters in the tropics and subtropics”, publicado na Biodiversity and Conservation, os pesquisadores entrevistaram 49 pescadores em 37 comunidades com uma série de perguntas sobre as interações com estas quatro espécies na região do Médio Juruá. 

Os entrevistados classificaram as quatro espécies de acordo com o grau de problema que causam, e o jacaré foi considerado a maior fonte de conflitos, seguido pelo boto, ariranha e tucuxi. Esse resultado era esperado, afinal o jacaré representa uma ameaça direta à vida humana. A maioria dos adultos no Juruá conhece, ou já ouviu falar de alguém, que tenha sido morto por um jacaré. Por outro lado, o conflito com o tucuxi foi raramente relatado. Apesar de todas as quatro espécies serem descritas como um problema até certo ponto, a maioria dos entrevistados relatou que poderiam continuar convivendo com elas, mesmo que suas populações aumentassem no futuro, o que é uma notícia realmente positiva em termos de conservação.

Quando os animais ficam presos nas redes de pesca, a reação dos pescadores pode variar bastante dependendo do animal que encontrem. Quando é um boto ou um  tucuxi, os pescadores soltam na maioria das vezes (79% e 86% das vezes), enquanto o jacaré é morto em 93% das vezes. Curiosamente, 40% dos entrevistados afirmaram que as ariranhas podiam escapar das redes de pesca sem assistência, provavelmente devido à sua capacidade de rasgar as redes com seus dentes e garras. 

Conforme esses conflitos ocorrem, os pescadores mudam o local de pesca para evitá-los. A descoberta de que, mesmo com essas ameaças, os pescadores acreditam que podem continuar a conviver com essas quatro espécies é uma ótima notícia para o futuro da floresta. É uma demonstração da sabedoria dos moradores, que entendem a importância de compartilhar a floresta com os animais, apesar dos conflitos que precisem lidar.

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